10 de fevereiro de 2011

«É bom trabalhar nas Obras» (70)

«# No domingo, a Ana Luisa, a Nena e a Maricarmen vão ao cinema e depois ao toque de recolher na praça. A Maricarmen perguntou-me se eu gostava da Ana Luisa. Como bom cobarde, respondi –: Não, como é possível pensares isso: há raparigas mil vezes mais bonitas.
# Cheguei à praça às seis e meia. Encontrei o Pablo e outros da escola e pus-me a andar às voltas com eles. Pouco depois, apareceu a Ana Luisa com a Maricarmen e a Nena. Convidei-as para comer gelados no Yucatán. Falámos de filmes e de Veracruz. A Ana Luisa quer ir para México. O Durán veio buscar-nos com o carro grande e fomos deixar a Ana Luisa. Quando ela desceu, as minhas irmãs começaram a fazer troça de mim. Às vezes, odeio-as mesmo a sério. O pior foi quando a Maricarmen disse –: Não tenhas ilusões, pequerrucho: a Ana Luisa tem namorado, só que não está cá.
# Depois de muito hesitar, à tarde esperei pela Ana Luisa na paragem do eléctrico. Quando desceu com as amigas, cumprimentei-a e deixei-lhe um papelinho na mão:
Ana Luisa: Estou apaixonado por ti. É urgente falar contigo a sós. Amanhã vou-te cumprimentar como agora. Dá-me a tua resposta da mesma forma. Diz-me quando e onde podemos ver-nos, ou se preferes que não te volte a incomodar.
Depois, pareceu-me que meti a pata na poça na última frase, mas já não há remédio. Não creio que me vá responder. É mais que certo que me vai mandar para o diabo.
# Passei o dia todo muito inquieto. Ao contrário do que esperava, a Ana Luisa respondeu:
Jórge, cumo tás apaixonado por mim, asseito que falemos, vemonos no domingo ó meidia nos acentos de Villa del Mar.
# Durán –: Estás a ver? Não te disse que eram favas contadas. Agora, segue os meus conselhos para não a chateares no domingo.
Maricarmen –: Olha lá, o que é que tu tens? Porque é que andas tão contente?
O pior, é que não tenho estudado nada.»
[José Emilio Pacheco, O princípio do prazer; em tradução para a Colecção Ovelha Negra / Oficina do Livro]

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