4 de maio de 2010

Nem sempre a lápis (19)

Temperada a euforia da confeição do blogue, onde reconheço analogias entre a aplicação filatelista da infância e a síndrome adulta do fecho de página, alguns visitantes – além dos assinantes da publicação, os seguidores – perguntam porque não exponho os meus títulos online. Durante os ensaios considerei um catálogo encabeçado pelos recentes, seguidos pelos anteriores; mas não contemplo o comércio dos livros, só enquanto sinónimo de convivência. Animado pela diversidade da cinzelagem informática, concedia aos dois últimos a miniatura da capa; aos anteriores, a visibilidade do título que as mostrasse. Depois debati-me com os termos da validade e acabei por me esquecer, com a naturalidade com que raramente me ocorre folhear as laterais dos blogues, as breves; a mancha gráfica lê-se de frente e à altura dos olhos, tudo o resto é arrastar de móveis, decoração de interiores. Cheguei a casa tão ansioso por brincar com o álbum em branco que assim o deixei, com os cromos espalhados no ambiente de trabalho. Preocupado com o espaço que o arquivo ocupará não sei onde, pelo sim, pelo não, acedi à convidativa opção «eliminar», habilidade que fez rir boa gente e mereceu este curioso comentário: «Achei estranho, mas pensei tratar-se de uma modalidade qualquer de apagamento do passado…» Mal a assinante sabia o que anotei há cerca de um ano, quando ponderava a edição a laser impressa nas casas da especialidade: «assaltou-me esta deliciosa dúvida: a sobrevivência da impressão, quanto tempo precisará para se transformar num livro em branco.» Quanto aos meus livros – cinismo e modéstia à parte –, a minha função é escrevê-los para que os editem ou eu os edite. Presentemente, as poupanças resumem-se a dois títulos facilmente resgatáveis; não esgotada a possibilidade de me contradizer, nem sempre a lápis. A minha relação com a via postal consumiu-se até ao esporádico correio azul depositado no marco; ninguém imagina a canseira cada vez que tenho de ir ao Correio.

Bem gostaria que a estação que frequento fosse congénere da que Vila-Matas encontrou em Paris e descreveu no Diário Volúvel, com a voz de Billie Holliday em fundo. O problema, nem reside no «problema» se estivesse em Paris, mas porque a música de fundo que ecoa pelo país não ser coisa que se recomende; que mereça a «futilidade» de ser anotada.

1 comentário:

Cristina Gomes da Silva disse...

pois não, pois não, é quase marcha fúnebre