O passaporte caduca dia 1 de Julho; desconheço se o termo se situa no final do mês anterior ou a partir das vinte e quatro horas do início do mês seguinte. Lido muito mal com a linguagem burocrática, nas suas mais labirínticas extensões; inexpressivas. Não posso ficar de braços cruzados a assistir à conclusão de uma década de vaivém estreado em Tarifa, excepto a única alternativa de o carimbar em Algeciras e Sebta; Ceuta é o nome português do enclave espanhol, do outro lado. Descobri-o em estado terminal por acaso, «como se diz neste tipo de circunstâncias» (Antonio Orejudo), enquanto arrumava a gaveta e acabei por dar uma pequena volta de passaporte para desentorpecer as páginas. Cada pancada de carimbo, num recuo cronológico desordenado do final para o meio, gravou um episódio intransmissível nas folhas voltadas pelas mãos grosseiras de polícias mal-humorados na gare marítima de Tânger; à entrada e à saída. Já percebi que tenho de entrar por lá até Julho, para sair do passaporte de cabeça erguida com dois bilhetes de ida e volta a Asilah. Desta vez, só passarei por Tânger o tempo necessário para apanhar o autocarro e o ferry; tenciono cremar-lhe a validade hospedado no Pátio de La Luna, com a janela aberta para a muralha da Medina. Revoadas de cheiro a eucalipto e a glândula de gazela, fogareiros e iodo, trazidos pela brisa; gatos indolentes numa esteira de folhas prateadas; o trote irregular de uma carroça, puxada por um burro, empurrada pela nódoa debotada de uma djellaba; a algaraviada de outras províncias.
Arquivar uma história para poder abrir outra, sem necessidade imediata de passaporte, com «o destino delineado na asa do pássaro migrante.» (Tahar Ben Jelloun)
31 de maio de 2010
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6 comentários:
Há dias consegui encontrar este seu livro, mas ainda não o comecei a ler.
E esqueci-me de acrescentar ao anterior comentário que como gostei do Entre Chipiona e Tarifa, tenho andado à procura de outros livros seus (que não são fáceis de encontrar) e também consegui encontrar o Blues Para Uma Puta Velha (que também não comecei ainda a ler).
Obrigado. Quanto aos livros tem várias alternativas: desde a «casa-mãe» http://frenesilivros.blogspot.com/
a uma boa visita à Letra Livre, Pó dos Livros, Poesia Incompleta, Trama, por ordem alfabética para não melindrar ninguém :)
Agora fui eu que me esqueci de lhe dizer que a circulação resume-me a este pentagono lisboeta. Como deve calcular, tiragens de 200 pinóquios não sobrevivem fora dele, do tal pentagono
São 4 da manhã e cheguei à «casa de ninguém»; ouço as gaivotas e dentro de dias estarei em Asilah. Fique bem :)
Bem, chegaram ao Porto e a Gaia :) (foi onde eu encontrei os três livros, o 1º na Bertrand do Dolce Vita, o 2º na Bertrand da Rua Santo António e o 3º na Fnac do Gaia Shopping)
(aqui pouco passa da meia-noite)
Muito obrigada :)
Obrigado, mas conserve as indicações que lhe dei para os livros/autores que não chegarem ao Porto ou a Gaia.
Fique bem :)
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