«É melhor eu explicar o que significava então o conceito de “andar” com alguém, já que o tempo o alterou. Falei recentemente com uma amiga, cuja filha chegara ao pé dela num estado de aflição. Estava no segundo trimestre da universidade e tinha dormido com um rapaz que andava – abertamente e com conhecimento dela – a dormir com várias outras raparigas ao mesmo tempo. O que ele fazia era uma audição a todas, antes de decidir com qual viria a “andar”. A filha estava perturbada não tanto pelo sistema – embora em parte se apercebesse da sua injustiça – mas pelo facto de, no fim, não ter sido escolhida.
Instalei-me numa rotina aprazível de trabalho, tempos livres com Veronica e, de volta ao meu quarto de estudante, masturbação explosiva com fantasias dela deitada por baixo ou em arco sobre mim. A intimidade diária fazia-me sentir orgulhoso de perceber de maquilhagem, práticas de vestuário, depilação feminina e o mistério e consequências da menstruação da mulher. Dei por mim a invejar esse aviso regular de uma coisa tão totalmente feminina e definidora, tão ligada ao grande ciclo da natureza. Posso tê-lo expressado assim, mal, quando tentei explicar o sentimento.
“Estás só a romancear aquilo que não tens. A sua única finalidade é dizer-me que não estou grávida.”
Dada a nossa relação, aquilo pareceu-me atrevido.
“Bem, espero que não estejamos a viver em Nazaré.”
Seguiu-se uma daquelas pausas em que os casais concordam tacitamente em não discutir um assunto. E o que havia para discutir? Só talvez os termos não escritos do acordo.»
[Julian Barnes, O Sentido do Fim; trad. Helena Cardoso, Quetzal 2011]
2 comentários:
gostei :O vai para a lista
Só mesmo um homem, para ver tanta poesia na menstruação... :P
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