«Hendrik deseja constituir família, uma família humilde, só sua, paralela à família do meu avô e do meu pai, para apenas falar destes. Hendrik gostava de ter uma casa cheia de filhos e filhas. Foi por isso que se casou. O segundo filho, pensa ele, o obediente, ficará lá, aprenderá o trabalho de lavoura, será o seu braço direito, casará com uma boa rapariga e dará continuidade à família. As filhas, pensa ele, trabalharão na cozinha da fazenda. Aos sábados à noite, serão cortejadas por rapazes de herdades vizinhas que virão de muito longe, pelo veld fora nas suas bicicletas, de guitarras a tiracolo, e farão filhos fora do casamento. O primeiro filho, o mais resmungão, o que nunca diz sim, sairá de casa para ir procurar trabalho nos caminhos-de-ferro, será esfaqueado numa briga, morrerá sozinho e deixará a mãe de coração desfeito. Quanto aos outros filhos, os mais apagados, talvez também partam em busca de trabalho e nunca mais se saberá deles ou então morrerão durante a infância juntamente com algumas das filhas e assim, embora a família se ramifique, não se ramificará muito. São estas as ambições de Hendrik.»
[J. M. Coetzee, No Coração Desta Terra; trad. Maria João Delgado, cortesia da revista “Sábado”, 3€;
stand by me]
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