«Pertence à cada vez mais rara estirpe dos editores cultos, literários. E assiste todos os dias comovido ao espectáculo de ver como o ramo nobre do seu ofício – editores que ainda lêem e os que se sentiram sempre atraídos pela literatura – se vai extinguindo no começo deste século. Teve problemas há dois anos, mas soube fechar a tempo a editora que, ao fim e ao cabo, embora tendo alcançado um notável prestígio, rolava com assombrosa obstinação para a falência. Em mais de trinta anos de trajectória independente houve de tudo, êxitos mas também grandes fracassos. O declínio da etapa final atribuiu-o à sua resistência em publicar livros com as histórias góticas na moda e outros pastelões, e esquece assim parte da verdade: que nunca se distinguiu pela sua boa gestão económica e que, por outro lado, talvez o tivesse prejudicado o seu excessivo fanatismo pela literatura.
Samuel Riba – Riba para todo o mundo – publicou muitos dos grandes escritores da sua época. De alguns, somente um livro, mas o suficiente para que estes constem no seu catálogo. Às vezes, embora não ignore que no sector honrado do seu ofício ficam no activo mais alguns corajosos dom quixotes, custa-lhe ver-se como o último editor. Tem uma imagem algo romântica de si mesmo, e vive numa permanente sensação de fim de época e de fim do mundo, sem dúvida influenciado pela paragem brusca das suas actividades. Tem uma notável tendência para ler a sua vida como um texto literário, para interpretá-la com as deformações próprias do leitor empedernido que foi durante tantos anos. Está, por outro lado, à espera de vender o seu património a uma editora estrangeira, mas as conversações encontram-se encrencadas há já algum tempo. Vive numa fortíssima e angustiada psicose do fim do mundo. E ainda nada, nem ninguém o conseguiu convencer de que envelhecer tem a sua graça. E tem?»
[Enrique Vila-Matas, Dublinesca; em tradução para a Teorema]
Sem comentários:
Enviar um comentário