«Passei o último serão a escolher as coisas que ia levar, sabendo que para onde ia não havia carrinhos de bagagem, escadas rolantes nem bagageiros que me facilitassem as coisas. Despedira-me de todos e já estava possuído pela habitual alegria de me pôr a caminho, a sensação de alívio sempre nova que me inunda por saber que ninguém poderá alcançar-me, que não tenho marcações feitas nem me esperam em lado nenhum, que não tenho compromissos a não ser os que o acaso possa originar. Adoro misturar-me assim com a multidão, tornar-me um viajante qualquer, liberto do meu papel, da imagem que temos de nós próprios e que por vezes é uma gaiola tão apertada como a do corpo; com a certeza de não dar de caras com alguém com quem tenha a obrigação de conversar e com a liberdade de mandar para o diabo o primeiro que tente fazê-lo.»
[Tiziano Terzani, Disse-me Um Adivinho; trad. Margarida Periquito, Tinta-da-China, Novembro 2009]
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