«O casarão do velho Belladona ficava no cimo de uma cumeeira, ao fundo de uma mata de eucaliptos, e era preciso subir um caminho tortuoso que ascendia por entre as árvores. Renzi tinha contratado um carro e o chofer explicou-lhe como chegar à casa. Tinham parado numa curva, perto de um trilho que levava a uma grade electrificada e aos portões da entrada. O casarão tinha o nome lavrado numa placa de ferro forjado: Los Reyes. Renzi desceu e antes de chegar à grade, surgiu o encarregado da segurança com óculos pretos e cara de cansado. Entrou em contacto com a casa com um walkie-talkie e, pouco depois, abriu a porta e deixou-o entrar. Renzi esperou numa sala de tectos altos e amplos janelões que davam para o jardim. Havia quadros e fotos nas paredes e cadeirões de couro, como se fosse a sala de espera de um edifício público.
Passado um pouco, apareceu uma empregada com aspecto de enfermeira que o fez subir por um elevador para o andar de cima e o deixou em frente de uma porta aberta que dava para uma enorme sala, quase sem móveis. Ao fundo, Renzi viu um homem alto e forte que o esperava de pé, imponente. Era Cayetano Belladona.
- O Bravo disse-me que o senhor me queria ver – disse Renzi, depois de se sentarem em dois amplos cadeirões colocados contra a parede.
- E a mim, o Bravo disse-me que o senhor me queria ver… portanto, o interesse é mútuo – riu-se o Velho. – Isso não tem importância, o que importa são as notícias que o senhor anda a publicar nesse jornal da Capital. Lemo-las e pensamos que esta terra é um campo de batalha. Fala de fontes que não refere e isso, como sempre que um jornalista cita fontes reservadas, quer dizer que está a mentir.
- Posso citar essa opinião? – disse Renzi.
- Não gosto dessas histórias sobre a minha família – disse o Velho, como se não o tivesse ouvido – e os seus disparates sobre as razões pelas quais Anthony trouxe esse dinheiro. – Não está com rodeios, pensou Renzi, e puxou de um cigarro. – Não se pode fumar aqui – disse o Velho. – E isto não é uma entrevista, quis simplesmente conhecê-lo. De maneira que não tome notas, nem grave nada do que falarmos.
- Sim – disse Renzi. – Uma conversa privada.
- Sou um homem de família numa época em que isso já não significa nada. Defendo o meu direito à privacidade. Não sou uma pessoa pública. – Falava com extrema calma. – Os senhores, os jornalistas, estão a destruir o pouco que nos resta de solidão e de isolamento. Murmuram e difamam. E gritam sobre a liberdade de imprensa que, para os senhores, significa simplesmente liberdade para vender escândalos e destruir reputações.»
[Ricardo Piglia, Alvo Nocturno; traduzido e em revisão para a Teorema;
1 comentário:
e para nós é excelente que goste de trabalhar nas obras!
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