12 de junho de 2011

Papiro do dia (84)

«Quis agora mesmo dar rédea solta a pensamentos de ódio, mas proíbo-me de o fazer. Depois quis ler mas não consegui, o livro não me prende, então pu-lo de lado, porque não consigo ler se a leitura não me entusiasmar. Por isso estou agora sentado a esta mesa e ocupo-me da minha pessoa, até porque não tenho no mundo ninguém que anseie por receber notícias minhas. Há já quanto tempo não escrevo uma carta calorosa? Aquela carta a Frau Weib fez-me ver claramente como eu fui sacudido e empurrado para fora de um círculo de pessoas próximas e preocupadas, como me faltam pessoas que por razões naturais tenham o justo direito de me exigir notícias sobre o que faço e como estou. Aquela carta foi escrita com um sentimento pensado e imaginado, é uma carta verdadeira mas ao mesmo tempo é uma invenção, criada por um espírito muito assustado por não ter nenhumas relações simples nem próximas. Agora já me sinto mais calmo? Sim. E é ao silêncio do meio-dia que digo estas palavras. Em meu redor reina um sossego domingueiro, que pena não ter ninguém importante a quem o dizer, daria um bom começo para uma carta. Mas agora quero dizer algumas coisas sobre mim.»

[Robert Walser, O Ajudante; trad. Isabel Castro Silva, Relógio d’Água 2006]

4 comentários:

Claudia Sousa Dias disse...

Gosto. Ma aquele queque de chocolate com mirtilos é uma tortura para quem precisa de emagrecer pelo menos dez quilos. Para começar. :-(

fallorca disse...

Ora, se não haveria de vir lamúria de Pantera...
Se fosses electricista (=pernas de alicate) também não te convidava para um cupcake na Tease
Fiufiu...

margarete disse...

:) foi lanchar ao theoria poiesis praxis?

fallorca disse...

Claro, mas o estabelecimento estava vazio... self-service ;)