A primeira vez que me refugiei em Armação, na casa de ninguém, tive duas bicicletas. Comecei por uma pasteleira adolescente, cor-de-rosa e sem mudanças, imediatamente baptizada Rosete e estímulo para troca de galhardetes com os empregados das esplanadas que frequentava. Acabava o trabalho, recolhia a Rosete debaixo da escada do prédio e demandava o mar a pedalar pelo nome da rua que se oferecia. Encostava-a ao paredão do bar da lota, sem problemas, mas a pequena subida para a Fortaleza e descida em roda livre até ao Tapas, era recebida com um invariável: «A Rosete dá cabo de si.» Reconsiderei o caso e propus a troca por uma com mudanças e fruto de vários cruzamentos urban-cross, ao cicloturista que me vendeu a Rosete, retirada de um lote agrilhoado a um loendro com corrente e respectivo cadeado. De nada lhe valeu a precaução: não consta que alguma vez lhe tenham roubado uma bicicleta, mas pedaleiras mais expeditas cortaram-lhe a ocupação do loendro público cerce ao pavimento de fóiaite que substitui a calçada, onde se negociava e concertavam bicicletas. Ao fim das tardes em que não fui à praia, vou com os cães até ao rio e sento-me a ver passar ciclistas; braço apoiado no guiador, perspectiva Miller. Ainda me lembrei de ter pena, sem lamentar, ter dado a bicicleta à mulher que cozia o pão, a Lena, numa atitude de boa vizinhança. Poucas vezes a vi usá-la, durante os anos que vivi no Monte Alto. Admito que desconhecesse o significado do gesto e a pudesse ter ofendido; não a uso, dou-lha. Não faz mal, delicio-me a passear de bicicleta entre a antiga lota de Portimão e o Clube Naval, arrumada no vão da escada da casa da mãe da Nico; delicio-me tanto como a subir o Arade a bordo de um barco de pesca cruzado com um moliceiro, «2.30 horas de passeio – sumo e vinho incluído», alerta-me o folheto, antes de consultar a provocação dos horários.
16 de outubro de 2011
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2 comentários:
não consigo tirar os olhos desta fotografia.
Mérito da Nico :)
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