30 de agosto de 2013
Às vezes, lá calha...
«Desde a infância que fui um leitor voraz. A consequência mais importante desta absorção ininterrupta era o atear de uma revolta ainda maior dentro de mim, o estímulo do desejo latente de viagens e aventura, o tornar-me anti-literário.»
(Henry Miller)
Nem sempre a lápis (388)
Longe do mundo
Tacteio o ar para esquecer a aridez do tempo.
Nos corredores ainda se ouvem as correrias e os gritos da infância,
mas tudo não passa de uma ilusão para adiar a noite.
Os telhados vibram como escamas ao sol, e a casa treme sob as pálpebras.
Devorei cidades e casas. Armadilhado pela torpeza das emoções e sentimentos
destrui vidas e recusei o futuro. Alimentei a ansiedade e o ódio.
Apátrida e faminto
troquei as giestas pelos sapais, o suão pela maresia. E seria tudo, outra vez.
[Longe do mundo; frenesi, 2004]
Papiro do dia (429)
«Dos dezoito em diante (a idade com que Rimbaud passou pela sua crise), tornei-me completamente infeliz, desgraçado, destruído, desencorajado. Só uma mudança completa de ambiente parecia capaz de dissipar esse estado permanente. Aos vinte e um fui-me embora, mas não por muito tempo. Mais uma vez como Rimbaud, os primeiros voos foram desastrosos. Voltava sempre para casa, voluntária ou involuntariamente; sempre num estado de desespero. Não parecia haver uma saída, uma forma de levar a cabo a libertação. Aceitei as tarefas mais estúpidas, tudo o que não tinha inclinação para fazer. Como Rimbaud nas pedreiras de Chipre, comecei com pá e picareta, à jorna, como trabalhador migrante, vagabundo. Até no facto de ao sair de casa ter sido com a intenção de viver uma vida ao ar livre, de nunca mais pegar num livros, de viver à custa dos meus dois braços, de ser um homem dos campos abertos e não o cidadão desta aldeia ou daquela cidade, até nisto há uma semelhança com Rimbaud.
Contudo, a minha linguagem e as minhas ideias traíam-me constantemente. Quer eu quisesse quer não, eu era em absoluto um homem literário. Embora fosse capaz de me dar com quase qualquer tipo de pessoa, em especial com o homem vulgar, acabava sempre por parecer suspeito. Era bastante semelhante ao que se passava nas minhas visitas à biblioteca: o meu pedido estava sempre mal. Por maior que fosse a biblioteca, o livro que eu pedisse havia de estar sempre requisitado ou de me ser recusado por qualquer razão.»
[Henry Miller, O Tempo dos Assassinos; trad. Manuela R. Miranda, Hiena Editora, Outubro 1985]
28 de agosto de 2013
26 de agosto de 2013
23 de agosto de 2013
Às vezes, lá calha...
«O único poeta vivo capaz de me dar qualquer coisa que se aproxime do prazer e do entusiasmo que encontro em Rimbaud é Saint-John Perse (não deixa de ser curioso que Vents tenham sido traduzidos, aqui em Big Sur, por Hugh Chisholm).»
(Henry Miller)
Nem sempre a lápis 387)
Longe do mundo
7. Acerco-me da água como as aves: surpreendido e atento.
7. Acerco-me da água como as aves: surpreendido e atento.
Tudo quanto me rodeia é novo e mais pesado que o ar.
Tábua de nódoas bramindo contra o vento
trespassado por um sopro.
As piteiras aquecem-me o caminho. Inscrevo a cada passo um percurso denunciado pelo pó, à medida que o horizonte recua.
Não me volto para trás, sei que as tábuas envelhecem sob a chuva.
Papiro do dia (428)
«Foi precisamente há cem anos, completados em Outubro passado, que nasceu Rimbaud. Em França, o centenário foi comemorado de maneira espectacular. Convidaram-se escritores famosos do mundo inteiro para a peregrinação a Charleville, berço do poeta. As festividades adquiriram foros de acontecimento nacional. Quanto a Rimbaud, provavelmente deu uma volta na sepultura.
Desde a sua morte que têm sido traduzidas parcelas da volumosa obra de Rimbaud, nas mais variadas línguas, do turco ao bengali. Onde quer que subsista o gosto pela poesia e pela aventura, o nome de Rimbaud constitui palavra passe. Nos últimos anos o culto rimbaldiano ganhou proporções espantosas e a quantidade de publicações dedicadas à vida e obra do poeta aumentam vertiginosamente. Não há outro poeta da era moderna de quem se possa dizer que receba a mesma atenção e a mesma consideração.
Para além de Uma Estação no Inferno e das Iluminações, só um pequeno número de poemas acabou por ser traduzido para a nossa língua. Mesmo essas poucas traduções revelam uma ampla e inevitável variedade de interpretações. Contudo, por muito que o seu estilo e o seu pensamento sejam difíceis e inapreensíveis, Rimbaud não é intraduzível. Mas fazer justiça à obra é problema diferente. Está por aparecer, na língua inglesa, o poeta capaz de fazer por Rimbaud o que Baudelaire fez pela poesia de Poe, ou o que Morel e Larbaud fizeram pelo Ulisses.
Só agora se começa a compreender o que Rimbaud fez pela linguagem, e não apenas pela poesia. E, creio bem, mais os leitores que os escritores.»
[Henry Miller, O Tempo dos Assassinos; trad. Manuela R. Miranda, Hiena Editora, Outubro 1985]
20 de agosto de 2013
Nem sempre a lápis (386)
Longe do mundo
6. Esta tarde não tem gaivotas, nem se levantam papagaios junto ao rio. Os barcos cabeceiam ao sabor do abandono.
6. Esta tarde não tem gaivotas, nem se levantam papagaios junto ao rio. Os barcos cabeceiam ao sabor do abandono.
Havia um cata-vento que marcava as artes,
a festa da armação,
quando o zinco do atum oxidava a costa.
As sardinheiras ainda ardem nas ânforas, mas os passos já não ressoam na rua do Tresmalho.
As alcofas esbanjam a frescura das hortas. Sobre as bancas os peixes fitam o mercado, atónitos. Pomar mediterrânico
no gume da fartura e da extinção.
O rio dorme sob a ponte;
os barcos já não transportam a cobiça da fruta.
Papiro do dia (427)
«O estado de transe é um estado quase normal no ser humano; basta muito pouco para provocá-lo. Uma coisa de nada, um pouco de álcool no sangue, um pouco de droga, excesso de oxigénio, a cólera, o cansaço. Mas este estado é interessante na medida em que é orientável. Trata-se de um balanço, mas esse lança mão das regiões desconhecidas do nosso espírito. De facto, não há fundamentalmente nenhuma diferença, entre um homem intoxicado pelo álcool e um santo que se entregue ao êxtase. E no entanto há apesar de tudo uma diferença: a da interpretação. O momento de loucura é preparado por uma etapa onde o assunto é mergulhado numa espécie de vacilação da consciência, de excitação cerebral violenta. É esse momento que fabrica verdadeiramente o êxtase e lhe dá o sentido. Enquanto o êxtase em si mesmo é cego. É o vazio total, sem ascensão nem queda. A calma plana. Tanto quanto se possa dizer que o santo nunca conhecerá Deus. Aproxima-O, depois regressa. E estas duas etapas são as que são. Entre as duas, é o nada. O vazio, a amnésia completa. No momento X do êxtase, o santo e o intoxicado são semelhantes, estão no mesmo local. Habitam o mesmo paraíso vazio e terrífico.»
[J.-M. G. Le Clézio, A Febre;
17 de agosto de 2013
Porque a Net fornece um novo dia
Só Anjos e Prostitutas.
«... não tenho interesse nenhum em bibliotecas, colecções, catálogos... ainda me acontece algum azar assim destes, meter o valter ao lado do Orwell (...) depois de Santo Agostinho há para aí uns cinquenta livros que eu gosto, e já é puxar muito a carroça. (...) ... agora o que mais gosto nos livros são as roupas das mulheres, é uma má frase, fica para mim, que toquei aquele vestido curto da A., e agora ia continuar, faria um catálogo, uma lista, iria referir-me ao biquíni da R. chamando-lhe "tapa-conas", o que ficaria mal num texto que se quer melancólico, triste, negro e etc, e que foi numa das nossas visitas à praia que me lembrei de escrever um longo e aborrecido texto que de título levava, Prática e Método, autoria de Professor Piçarra, conólogo. Não começámos bem, logo aí, até porque já tinha na arca outro título, à espera de melhores dias, o Teorias da História: Escola dos Anais. Edição anotada e tudo.»
Nem sempre a lápis (385)
Longe do mundo
5. É um mercado de varas e silêncio. O sol esmaga-lhes o pregão, o dialecto
e a fruta fustiga o olhar dormente. Talha o azeite.
O Sul é uma memória de barro e o pó a sua permanência.
As laranjeiras acendem a folhagem na hemorragia do grés, mapa anatómico que me custa soletrar.
Então encosto a cabeça à parede e o adobo revela-me a tua essência. Decanto o mel.
Nenhuma praia é suficientemente grande para me devolver o mar.
Papiro do dia (426)
«É um erro acreditar que se escreve com palavras. Quem assim pensa está perdido, as palavras são uma cilada.
Suponho que é isso o que me angustia e apavora em alguma poesia, de que logo fujo quando começo a lê-la: a procura obsessiva das palavras que se torna quase um fim em si mesma, a tentativa suicidária da depuração do texto até ao osso.
(…)
Quando alguém morria cobriam-se todos os espelhos da casa. Para resistir à tentação de olhar-se, condenando as vaidades mundanas? Por medo de ver assomar no espelho o espectro do defunto?
No dia do funeral a tia Conceição pendurava no tecto do sótão, suspenso por um fio, o chapéu que o defunto tivesse usado mais vezes. Quando o fio se quebrava e o chapéu caía, era sinal de que a alma tinha entrado no céu.
Mas a tia Otelina, a irmã mais nova que vivia com ela, era um coração de manteiga e não queria sofrimento nem castigo para quem andava a penar. Por isso de vez em quando subia até ao sótão às escondidas e raspava o fio com a lima das unhas, acelerando a queda do chapéu.»
15 de agosto de 2013
A cona do Melro
[Nota da Redacção: E se ao ler o título alguma dama estreitar as nalgas e se interrogar sobre o "bico amarelo", eu diria que, não sendo tímida (ou cínica, ou fingida), o simples toque lhe ensopará os mais repenicados chilreios.]
10 de agosto de 2013
Nem sempre a lápis (384)
Longe do mundo
3. A casa extingue-se na tarde. Por momentos tenho a ilusão do silêncio,
e apenas o estalido dos salgueiros me lembra que estou vivo. Que uma sombra me aguarda.
Quando tudo retoma o seu lugar, um trilho escoou-se sob os meus pés.
A voz ecoa na planície e as alfaias são inúteis como palavras numa folha em branco.
Vi as aves dirigirem-se para o Sul com as asas cheias de esperança e mosto.
Setembro é tudo o que conservo e alimento.
Papiro do dia (425)
«Aos vinte anos, e ainda muito tempo depois, aterrava-me a ideia de que podia sem dar conta trocar a vida vivida pela ficcional. Terror de que a escrita alastrasse e preenchesse o meu lugar na vida.
Prudentemente, deixava sempre uma distância, uma dúvida, que não me deixava mergulhar completamente na paixão dos livros. Terror de me embrenhar dentro deles e de ser engolida, de desaparecer noutros mundos. Procurava nos filósofos, que me pareciam mais transparentes do que os escritores porque iam mais directamente ao mundo das ideias, o que neles achava distorcido, inadequado, neurótico, doente, desajustado. Nietzsche, Kierkegaard, Schopenhauer eram um terreno fértil para as minhas divagações.
Mas também escritores como Kleist, Kafka, Georg Trakl e muitos outros. Para mim a grande questão era se a avassaladora hipertrofia da sua vida mental os tinha conduzido ao desespero e confinado ao seu mundo interior sem saída, ou se pelo contrário a escrita foi a tábua de salvação, a forma que encontraram de não sucumbir, no seu mundo mental irrespirável.
A partir de dada altura não tive dúvidas de que esta hipótese era a verdadeira, ou pelo menos muito mais verdadeira do que a outra.»
[Teolinda Gersão, As águas livres – Cadernos II; Sextante, Abril 2013]
9 de agosto de 2013
7 de agosto de 2013
Porque a Net fornece um novo dia
Helena Almeida, Bernd e Hilla Becher, Daniel Blaufuks, Christian Boltanski, Marcel Duchamp, Allan McCollum, Chantal Joffe, Tracy Moffatt, José Luís Neto, Gabriel Orozco, Pedro Quintas, Umrao Singh Sher-Gil, Augusto Alves da Silva, Hiroshi Sugimoto, Vivan Sundaram, Jemima Stehli, Wolf Vostell, Robert Wilson, Francesca Woodman. Curadoria de Ruth Rosengarten*
Museu Colecção Berardo
(até 29 de Setembro de 2013)
Às vezes, lá calha...
«Digo sempre “a escrita”. Mas talvez devesse falar um pouco dos livros, ou pelo menos das suas circunstâncias. Porque tudo tem um lado terrivelmente concreto.»
(Teolinda Gersão)
Nem sempre a lápis (383)
Longe do mundo
2. É na curva da água que melhor reencontro a tua luz. Alfarroba ardente
com o açúcar disputado pela cal e as abelhas do meio-dia.
E basta nomear-te para o mar me arear as palavras, e o sol me devorar a vocação atónita.
Queria palavras novas, inventar uma outra linguagem para te perceber e celebrar.
Acreditava que o segredo estava nas palavras, e experimentei o corpo e o silêncio. Mas permanecias inacessível, confundindo-me a euforia dos gestos e o bulício da presença.
Um dia percebi que o teu olhar esvaziava as palavras
e dediquei-me ao horizonte. À febre.
Papiro do dia (424)
«A capa de um livro como a sua primeira manifestação concreta, a sua entrada no mundo visível. Um primeiro choque entre o livro imaginado e esse outro, que começa a existir nesse instante, através do olhar de outra pessoa. O autor da capa como leitor, como o que “vê” e dá a ver o livro, e dele transmite uma primeira aproximação, resumo ou retrato.
É nesse instante que o livro surge que o seu autor começa a desaparecer. O que se segue, a partir daí, serão sempre outras visões, propostas, leituras, por vezes opostas à do autor, que, no seu conjunto, serão a vida do livro. Enquanto ele não morrer.»
4 de agosto de 2013
Nem sempre a lápis (382)
Sueste
4. Enquanto a secura lateja nos eirados, percorridos pelo silêncio das noras e alcatruzes esquecidos nos silvados,
a tarde dobra-se como o ferro nas bigornas, malhado pelo canto das poupas no pinhal.
A memória do homem dispõe os utensílios sobre a terra exangue e nenhuma ave se atreve a riscar o ar contaminado de pólen e de luz,
nenhuma árvore estremece na colina, refém da sesta e da ausência.
Só a cisterna interrompe a distância – aproxima as paredes gretadas, onde amealhava a água sob a sede – os cães espreguiçam-se e amarrotam o manto de pó,
esticam as patas calejadas e voltam a fechar os olhos cor de mel e remela seca.
Ninguém nasce ou morre à hora da sesta,
só a memória vigia os trilhos por onde a morte virá como um vagabundo sequioso,
enquanto puxamos o balde cabisbaixos e a corda nos sulca as mãos envelhecidas.
Papiro do dia (423)
«Há uma frase de Paul Valéry que creio assentar como uma luva à escrita de Teolinda Gersão: “ Ce qu’il y a de plus profond chez l’homme, c’est la peau”. (Traduzo, para quem já esqueceu o francês: “O que há de mais profundo no homem é a pele.”) Escritora discreta, apesar do reconhecimento, “As águas livres – Cadernos II” é a sua obra mais recente. O caderno I ficou lá para trás (1984) e chamou-se “Os guarda-chuvas cintilantes”, facto que a própria se encarrega de nos lembrar agora: “O primeiro, a que na altura não chamei Caderno, foi Os guarda-chuvas cintilantes. Dei-lhe como subtítulo Diário, o que provavelmente desconcertou os leitores. Na verdade, é um diário heterodoxo, que quebra os dois pilares em que era suposto assentar: o eu e o tempo (…).” Confessadamente adversa a ortodoxias (nomeadamente, à dos “formatos”), Teolinda Gersão lança “As águas livres” a seguir ao romance “A Cidade de Ulisses”, surpreendendo-nos com um livro algo inclassificável. Com facilidade encontramos nele, pelo menos, três registos: o explicativo, o reflexivo e o descritivo. A sua organização e conteúdo fragmentários atravessam territórios vastíssimos, geografias diversas (dentro e fora do país) – aventurando-se também com mestria pelo universo dos sonhos –, desrespeitam o tempo-sequência, invocam questões/filiações literárias, não desprezam a política, sendo, no essencial, um exercício delicado de “atenção” ao mundo. A oficina é discreta, o narrador é despretensioso, o texto nunca se põe em bicos de pés. A sabedoria não chega com fanfarras, a palavra dispensa paramentos, o estilo (essa dificuldade de expressão a que se referiu Mário Quintana) é desataviado. «Kierkegaard aparece às vezes de visita.» (estou a citar).
[silêncio recém quebrado no "Expresso"]
1 de agosto de 2013
Nem sempre a lápis (381)
Sueste
3. Enquanto o dia se derreia de cheiros e silêncio, como os olhos frios de um ancião se apoiam nas sebes do futuro,
os orégãos toldam a eira e os pardais disputam as entranhas da palha trazida pelo sueste.
Só as osgas assomam entre as canas e as escamas do telhado, farejando a lentidão do ar,
os trilhos onde a luz se sacia,
contra uma parede de argila e memória ausente.
Só a roupa adeja vazia nas cordas ao sol e ninguém lhe responde ao aceno,
ninguém parte com a humidade que goteja no chão.
Ninguém irrompe nos labirintos de luz que atordoa as veias,
ninguém, já ninguém canta na lucidez inútil.
Papiro do dia (422)
«O reino do meu pai era e é, todos os autores concordam, vasto. Para caminhar de uma fronteira à outra, de leste para oeste, o viajante deve contar com não menos de dezassete dias. Chama-se Ho, o termo confucionista para harmonia. O nosso primeiro monarca interessava-se pelo confucionismo (um estranho gosto nesta região do mundo) e, depois de ter arrancado esta extensão de campos e florestas das mãos dos inimigos, há dois séculos, permitiu-se uma homenagem ao grande pensador chinês para grande gáudio de alguns dos nossos vizinhos mais sóbrios, cujos domínios tinham nomes corriqueiros como Norgales e Brandísia. A nossa economia baseia-se nas trufas, em que as nossas florestas são fenomenalmente ricas, e na electricidade, que já exportávamos quando outros países ainda liam à luz de candeeiros a petróleo. O nosso exército é o melhor da região, e todos os militares são coronéis – eis o subtil segredo da governação do meu pai, para dizer a verdade. Nesta terra, todos os padres são bispos, todos os advogados de meia-tigela são juízes do Supremo Tribunal, todos os camponeses são latifundiários e todos os palermas que proclamam as suas ideias à esquina das ruas são Hegel em pessoa. O génio do meu pai consistiu em promover os seus súbditos, homens e mulheres, todos por igual, incessantemente; os cidadãos de Ho aquecem-se para todo o sempre ao sol do Êxito. Eu era o único homem do reino que se considerava um burro.»
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