«A diferença entre nós era ela agarrar-se às suas recordações e permitir que lhe ensombrassem o presente, enquanto eu me esforçava ardor por perder as minhas e olhar para o futuro, para uma época em que já não me perturbariam. Então, abandonaria o que me rodeava, tal como uma borboleta saída da crisálida, e voaria em direcção a um futuro que não estivesse cheio das relíquias de outras pessoas. Mas a Alix esforçava-se por preservar um passado que não era só passado como se encontrava, também, ultrapassado, visto ter, então, a sua vida com o Nick. Por vezes, apercebia-me de que ela comparava ambos como se ambos a tivessem traído. Para mim era difícil compreender a situação, embora me limitasse a admirar a sua exigência. Os olhos semicerravam-se-lhe quando via os livros de Nick na secretária que pertencera, outrora, ao pai, e mantinha sempre os reposteiros meio corridos, por não poder suportar os caixilhos de metal ou a vista das casas, do outro lado da rua. A sala de estar encontrava-se constantemente semi-mergulhada na escuridão, o que parecia apropriado à sua natureza felina. Tudo isso escrevi eu no meu diário.»
[Anita Brookner, Olhem Para Mim; trad. Paula Reis, Teorema 1988;
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