- Quem me dera ter avisado o Tony que não viesse para cá – disse Bravo. Usa o mais que perfeito do substantivo, pensou Renzi, tão cansado que lhe surgiam esse tipo de ideias típicas da época em que andava na Faculdade e se punha a analisar as formas gramaticais e a conjugação dos verbos. Às vezes, não entendia o que lhe estavam a dizer porque se distraía a analisar a estrutura sintáctica como se fosse um filólogo embalado pelos usos tergiversados da linguagem. Agora, sucedia-lhe cada vez menos, mas quando estava com uma mulher, e lhe agradava o modo como falava, levava-a para a cama pelo entusiasmo que lhe provocava vê-la usar o pretérito perfeito do indicativo, como se a presença do passado no presente justificasse qualquer paixão. Neste caso, tratava-se só do cansaço e da estranheza que lhe causava estar nesta povoação perdida, e quando voltou a ouvir o barulho do bar deu-se conta de que Bravo lhe estava a contar a história da família Belladona, uma história igual a qualquer história de uma família argentina do campo, mas mais intensa e mais cruel.»
[Ricardo Piglia, Alvo Nocturno; em tradução para a Teorema;
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