5 de setembro de 2010

À mão de ler (78)


«Após um par de linhas, nada mais me ocorreu. Os meus pensamentos erravam já por outras bandas e eu não conseguia dar o arranque nem esforçar-me com mais firmeza. Tudo me distraía e influenciava, tudo o que via me causava novas impressões. Moscas e outros pequenos insectos pousavam no papel e incomodavam-me. Eu soprava para os fazer desaparecer, soprava com mais e mais força, mas em vão. Os bichinhos comprimiam-se, faziam-se pesados e resistiam, de tal forma que as suas patas finas se arqueavam. Não era possível fazê-los mexer dali. Encontravam alguma coisa a que segurar-se, faziam finca-pé contra uma vírgula ou contra alguma irregularidade do papel e permaneciam imperturbavelmete quietos até lhes apetecer ir-se embora.»
[Knut Hamsun, Fome; trad. Liliete Martins, Cavalo de Ferro, Outubro 2008;

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