1 de novembro de 2012

Papiro do dia (273)

«Por vezes havia velhos sentados, na soleira das portas, cães vadios, uma gaiola com pássaros na parede exterior de uma varanda, flores amarelas acumuladas em três palmos de jardins de cimento ou sobre os telhados de toscos galinheiros, e tu caminhavas assim até ao anoitecer longo e lento, o baixo anoitecer repassado de espanto, em que a pouco e pouco todas as coisas se tornam opressivas, e agora atravessas um campo baldio entre casas, e de súbito há no ar uma música distante, que deve vir de um carrossel ou de um circo, algures, do outro lado do campo, e por um instante paras a ouvir, mas de novo a música se interrompe e tu recomeças a caminhar, ao acaso, e não vais nunca para lugar algum.»


[Teolinda Gersão, O silêncio; Sextante, Setembro 2007;
ao acaso]

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