«E tudo isso se repetiu durante anos, durante anos ela imitou os gestos aprendidos, as palavras aprendidas, fingiu que falava a mesma língua, mas a tensão crescia, dentro dela, e um dia estalou de repente e as palavras soltaram-se, todas estrangeiras, de súbito ela cortou todas as falsas pontes e ficou como sempre estivera, isolada, dentro de outro contexto, de outro mundo, e havia uma palavra que ela repetia muitas vezes, algo como inas – inastranka, não sei, não me recordo ao certo, uma palavra absurda e louca e perigosa, porque não significava para nós coisa alguma mas tinha certamente sentido noutro código de que não possuíamos a chave, uma palavra inimiga, que estava para além do nosso alcance e nos agredia, nos insultava talvez sem nós sabermos, e outras vezes soava apenas como uma palavra resignada e morta, que não atingia ninguém e não significava coisa alguma, vibrava apenas no silêncio sem mudar nada, sem tocar em nada, uma palavra de vidro, de pedra, solta, isolada, neurótica, arrancada de todas as raízes, uma anémona do mar movendo no vazio os seus muitos braços, os seus cabelos roxos, uma anémona num aquário, por detrás de paredes de vidro.»
7 de novembro de 2012
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