«Como na realidade a minha História geral do vazio, no fundo, ia ser muito breve, aqui mesmo a dou por terminada. Vencido pela preguiça. Além disso, fui sempre volúvel, frívolo e disperso. Espero que se diga que essa História geral do vazio não passou de uma tentativa de, na realidade, nunca a escrever, e que fique como mais um vazio dentro da história geral do vazio, a mais oca de todas as histórias. Prefiro isto a que se ocupem de mim e me digam a verdade, digam que às vezes existo sem identidade e estou sempre ausente do lugar donde falo, e tudo o que se costuma dizer quando julgam que realmente há algo para dizer.
Prefiro limitar-me a ser uma personagem de Pierre Gould. Ou melhor dizendo, fazer-me passar pelo Pierre Gould actual, pelo herói – talvez o duplo – de Bernard Quiriny. No fundo, isso acabará por me ser mais estimulante do que escrever uma História geral do vazio e passar o tempo todo a lutar com a primeira frase. Fazer-me passar por Pierre Gould, o descendente do matemático de Tubinga, e um dias destes ir visitar Bernard Quiriny para lhe perguntar porque é que conta tantas histórias sobre mim.
Ou ainda melhor: não me fazer passar mas ser directamente Pierre Gould e ao mesmo tempo perguntar a Quiriny pelo seu segundo livro e averiguar se é verdade, como me disseram, que ele tem todo o aspecto de ser o Catálogo de ausentes que ando a escrever mentalmente, há já uns anos. Este segundo livro de Quiriny é realmente um catálogo de ausentes? Dito de outra forma, será que esse livro é de Pierre Gould, será que esse livro não é meu? Reclamo a sua autoria.»
[Do prefácio de Vila-Matas, in Contos Carnívoros, Bernard Quiriny; Ahab, muito em breve]
6 comentários:
que delicioso aperitivo :)
ai ai ai ai!!
Pois é imo, a salamandrine é que se queixa, eheh...
é feio gozar com as ansiedades dos outros.
Mói-te! fiufiu...
bah.
há-de haver um deus dos vila-matianos que te há-de castigar.
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