31 de janeiro de 2011

Nem sempre a lápis (127)

Tanizaki (El elogio de la sombra), Rafael Pérez Estrada (El ladrón de entardeceres), um mapa centenário da Ville de Tanger, Charles Simic (El mundo no se acaba y otros poemas), Jorge Enciso (Designs From Pré-Columbian Mexico). Não procurei, manifestaram-se por esta ordem enquanto fazia de conta que arrumava o espaço e criava ambiente para trabalhar; impôs-se outro trabalho, «a dor da solidão como angústia absoluta» (Doris Lessing), não andasse eu a ler Tavares. Flâneurs, além de encararmos o passeio como prefácio, tem-me proporcionado atitudes muito interessantes: ao consabido escorregar da leitura na cama, ler como se me sentisse de joelhos, chegar ao final de um período, de uma frase e parar; não estou a ler um autor traduzido. Enquanto desatarraxava lâmpadas flamejado fosco e as testava, a Nico resgatou dois livros de um monte de Corín Tellado, na casa de Portimão: Os Crânioclastas de João Palma-Ferreira e Secretos Raros de Artes y Oficios (tomo V. segunda edición con Real Privilegio, Madrid 1813). Desta vez, escolhi o candelabro que vou levar para a sala; qualquer dia. O mal-estar começou ainda na garagem, não pela dificuldade em lidar com o comando e a possibilidade de ficar retido por tempo indefinido; o mal-estar mostrou-se como um atril no meio do caos encaixotado e mumificado com manga de plástico. Veio-me logo à ideia o de Carlos María Dominguez, onde colocou o livro d’A Casa de Papel; aqui o atril não corre o risco de poder sujar-se com cimento, mas de ser ocupado pelo pó acumulado no cimento do chão. Chegado a casa da Nico, reparei o candelabro da cozinha com as lâmpadas recuperadas; apanhámos um susto por me ter esquecido do volume encadernado no carro, e não ter caído no percurso até casa, à chuva; depois de jantar, estiquei-me no canapé e devorei o conto do tradutor de Ulisses, publicado como gentileza da Editorial Estúdios Cor para com os seus amigos, no Natal de 1972. Quando nos deparámos com isto, especulámos sobre a forma como o livro chegou às mãos do casal de quem herdámos (mais uma) biblioteca. Embora não o tenha conhecido, imagino que a livraria Barata, a Buchholz possa ter oferecido o livro ao Ernesto; advogado e adito de literatura e de gravura, acolitado pela Cé, prima da Nico. E continuando a recorrer ao que a memória dela me emprestou, levantei-me e mostrei-lhe o casino que Palma-Ferreira descreve entre o final da página 13 e o início da 14: «Ou é um café muito pobre a que se chama casino há falta de outro nome.» Entre Ferragudo e Armação de Pêra, era um passeio; não sei se Lima de Freitas já ou ainda tinha a olaria ali em cima na curva, à esquerda de quem vai para Lagoa.

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