Mal penetramos no antro, correm para junto de nós pensionistas a estender-nos mãos com cartas, a suplicarem que olhemos para eles: “Olhe lá para mim! Por que estou aqui? Não sou louco. É uma infâmia. Vão deixar-me morrer nesta prisão?”
Gritos, gestos vivos não provam que estes emparedados tenham perdido o juízo. O homem que cai no fundo de um poço fará ouvir a sua voz, mal oiça alguém passar perto.
Outros estão calmos:
- Não nego que tive uma anemia cerebral, mas já lá vão três anos. Há mais de dois que não sinto nada, estou tão lúcido como antes estava. Por que me não dão alta?
Se fosse um doente do fígado, dos brônquios, dos intestinos, mal estivesse curado sairia do hospital. É isso que está nos hábitos, por a medicina geral ser mais velha do que a psiquiatria. Daqui a vários séculos a psiquiatria terá bases sólidas. No ano 2100 o curado terá direito a estar curado. Nos nossos dias tem de esperar pela sua hora; como a ciência espera a sua! O louco nasceu cedo de mais.
- Doutor, este homem está mesmo curado?
- É possível que sim. Há meses que o seu estado é normal. Mas não terá uma recaída?
Mais vale um homem ser bandido do que louco. Quando o bandido já cumpriu a pena, abrem-lhe a porta da prisão sem perguntar se vai voltar ao mesmo.»
[Albert Londres, Com os loucos; trad. Aníbal Fernandes, Sistema Solar, Julho 2012]
4 comentários:
Gostei tanto que vou levar comigo :)
Faz muito bem e a colecção ainda melhor ;)
Fiquei muito curiosa com o livro! Confesso que tenho uma atração especial pelo tempo e pelos loucos :)
ai o estigma!
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