«Com esta faz três vezes que lhe escrevo. Daí nada posso concluir, pus o primeiro bilhete num sítio que cá sei. Pela manhã cedo, se quiser, posso recuperá-lo. É tão breve e escrevi-o com tanto apuro que nem eu o entendo. O segundo, que não é muito melhor, mandei-o por uma mensageira, de nome Paula. Como você não deu sinais de vida, não vou insistir com mais cartas inúteis, que no melhor dos casos o indispõem.
Decerto você há-de perguntar: “Porque não manda Bordenave o cartapácio a um advogado?” Com o doutor Rivaroli só tratei uma vez, mas o gordo Ricardo (a quem o digo!) conheço-o há muito. Não me parece de fiar um advogado que organiza as suas rifas com o Gordo de rifeiro. Ou então perguntará: “Porque me manda ele a mim o cartapácio?” Se alega que não somos amigos dou-lhe razão, mas também lhe peço que se ponha no meu lugar, por favor, e que me diga a quem poderia eu mandá-lo. Depois de percorrer mentalmente os amigos – escusado Aldini, porque o reumático o entumece – elegi o que nunca o foi. A velha Zeferina pontifica: “Nós, que vivemos numa viela, temos casa numa casa maior ainda.” Quer ela dizer com isto que todos nos conhecemos.
Decerto bem se lembra como começou a disputa.»
[Bioy Casares, Dormir ao sol; trad. António Sabler, Editorial Estampa, Dezembro 1980]
Sem comentários:
Enviar um comentário