17 de julho de 2012

Papiro do dia (240)

«Para os escritores, o processo de ser esquecido não é claro. “É melhor para um escritor morrer antes de ser esquecido, ou ser esquecido antes de morrer?” Mas aqui “esquecido” é só um termo de comparação, que significa: sair de moda, ficar esgotado, ser desvendado, suplantado, considerado demasiado superficial – ou então demasiado grave, demasiado sério – para uma época posterior. Mas verdadeiramente esquecido, isso é muito mais interessante. Primeiro deixam de nos editar, somos relegados para lugares esconsos da loja do alfarrabista e do website comercial. Depois de um breve renascer, se tivermos sorte, com um ou dois títulos reeditados; pois outra quebra, e o período em que alguns estudantes finalistas em busca de tema de tese, virarão penosamente as nossas páginas, sem perceber por que escrevemos tanto. E por fim as editoras esquecem, o interesse académico desvanece-se, a sociedade muda e a humanidade avança um pouco mais, enquanto a evolução cumpre o desígnio inútil de nos transformar a todos no equivalente de amibas e bactérias. É inevitável. E a dado momento – tem logicamente de acontecer – um escritor terá um último leitor. Não peço comiseração; este aspecto da vida e da morte do escritor é inelutável. Num momento entre o agora e a morte do planeta daqui a seis biliões de anos, cada escritor terá o seu último leitor. (…) A dado momento, também para mim haverá um último leitor. E depois esse leitor morrerá. E se, na grande democracia dos leitores, todos são teoricamente iguais, há uns mais iguais do que os outros.»
[Julian Barnes, Nada a Temer; trad. Helena Cardoso, Quetzal, Maio 2011]