«Surgiram, como num sonho, no alto da duna, meio escondidos pela névoa de areia que os seus pés levantavam. Desceram lentamente para o vale, seguindo a pista quase invisível. À cabeça da caravana, vinham os homens envoltos nos seus mantos de lã e com os rostos dissimulados no véu azul. Com eles caminhavam dois ou três dromedários, seguidos pelas cabras e pelos carneiros espicaçados pelos rapazes. As mulheres fechavam o cortejo. Eram silhuetas pesadas, embaraçadas nos pesados mantos, em que a pele dos braços e das testas parecia ainda mais escura nos véus cor de anil.
Andavam sem ruído na areia, devagar, sem olhar para onde iam. O vento soprava continuamente, o vento do deserto, quente de dia, frio à noite. A areia corria em torno deles, entre as patas dos camelos, fustigava a cara das mulheres que baixavam a tela azul sobre os olhos. As crianças corriam, os bebés choravam, enrolados em tecidos azul às costas da mãe. Os camelos rosnavam, espirravam. Ninguém sabia para onde se ia.»
[J. M. G. Le Clézio, Deserto; trad. Fernanda Botelho, Dom Quixote, 3.ª ed. Fevereiro 2009]
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