«Maria entrou no quarto, ia botar outro vestido. Nico esperava na sala, amigos da Fazenda Rio Claro se acomodaram perto dele. Crianças corriam debaixo do abacateiro. Fechada no quarto, Maria desabotoou o vestido. Ganhou jarra, esteira, panela, boneca de pano, colcha bordada, travessa de vidro, concha, tesoura e mosquiteiro. Tudo sobre a cama do casal, o alumínio das panelas piscando luz no espelho do guarda-roupa.
- Vem, Maria, a Companhia de Reis chegou – falou Nico baixinho atrás da porta.
Um homem ágil, vestido de chita e máscara, fazia macaquices. Atrás vinham os músicos, uma sanfona, uma viola, uma caixa. Por último, um homem com calça de cetim segurava a bandeira, nela três estrelas e um menino. Os reis magos vinham dar a benção, com a bandeira desfraldada, entraram na casa. Final de Dezembro, o nascimento de uma coisa e morte de outra. Alinharam-se na cozinha e um negro velho entoou uma ladainha. A sanfona adocicou o grave da caixa, a voz cobriu a casa com vibração esvoaçante. O mascarado deixava vazar dois olhos de tempestade, girava a cabeça de um lado para o outro, dava pulos no mesmo lugar. Ao fim da ladainha aninhou-se aos pés do sanfoneiro. Nico beijou a bandeira e a levou por todos os cômodos, batizando a casa.»
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