«Não se passa quase nenhuma noite sem que meu pai nos mostre o lugar dos astros no céu, num grande mapa afixado na parede do escritório. Contemplo os mapas entre o cheiro a tabaco que envolve o escritório. Meu pai evoca Cook, Drake, Magalhães, que descobriu os mares do Sul a bordo do Vitória e veio a morrer nas ilhas da Sonda. Menciona Tasman, Biscoe, Wilkes, que atingiu os gelos eternos do Pólo Sul, e outros viajantes extraordinários: Marco Polo na China, de Soto na América, Orellana que explorou o Amazonas, Gmelin que foi até aos confins da Sibéria, Mungo Park, Stanley, Livingstone, Prjevalski. Escuto estas histórias, os nomes de países, a África, o Tibete, as ilhas dos mares do Sul: são nomes mágicos, como os nomes das estrelas, como os desenhos das constelações. À noite, deitado na minha cama de campanha, ouço o som do mar e do vento nos palmeirais. Recordo todos estes nomes, parece-me que o céu nocturno se abre e vou num veleiro navegando a todo o pano, no mar infindo, rumo às Molucas, à baía do Astrolábio, às Fidji, a Moorea. No convés deste navio, antes de adormecer, vejo o céu como ainda o não tinha visto, tão grande, azul-escuro sobre o mar fosforescente. Passo lentamente para o outro lado do horizonte e navego em direcção aos Reis Magos, ao Cruzeiro do Sul.»
[J. M. G. Le Clézio, O Caçador de Tesouros; trad. Ernesto Sampaio, Assírio & Alvim, Abril 1994;
sextante]
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