«Dobro a roupa
em monte
os doze meses inteiros,
e tento juntar, incapaz,
duas peças com sentido.
As que ficam,
isoladas
sem uso provável,
escondo-as dentro de páginas brancas:
entre cada uma
papel vegetal quase transparente
e cantos antigos de colar fotografias.
Em dez anos encontro
um herbário inesperado:
folhas perenes e secas,
as meias cerzidas, únicas,
são exemplos raros destes dias
quase extintos.
Leste os poemas fora do prazo
muito menos sóbrio do que parecias
e pensaste que também os versos
podiam coser-se ao pescoço.
O mesmo cordel que te prendia,
a mão aberta sobre o volante,
afundou-te o pé inútil -
travavas um carro plano, desligado -
e puxou-te do estômago
uma vaga confissão,
eco surdo das horas antigas:
avulsas, longas, gratas, iguais.»
[Margarida Ferra, Curso Intensivo de Jardinagem, & etc., Maio 2010;
foto: de previsível autoria, embora preferisse uma da Autora a ler n'A Barraca, na noite em que foram servidas rodadas de poesia]
2 comentários:
gosto.
Quem não gosta? É uma preciosidade, de um cuidado...
Enviar um comentário