Há dias assim, levantei-me consideravelmente mais cedo, por volta das onze, mas não me apetece trabalhar. Ponderei o bom argumento de ir ouvir João Rodrigues falar sobre Por Quem Os Sinos Dobram, tendo Hemingway como anfitrião para me apresentar a Casa da Achada e, por tabela, a tasca do Eurico; mas são praticamente tea mint o’clock e não disponho de um apetite de visibilidade urbana suficiente para ir a correr apanhar um autocarro, seguido de um táxi que justifique a institucional meia hora de tolerância. Pertenço ao público apagado que a reserva para esperar pelo começo e sair à francesa, a meio; entrar a meio, no que quer que seja, não faz parte dos meus princípios, desde o início. Passa-se o mesmo com O Cheiro dos Livros, o tal livro póstumo, e a entrada a meio do blogue homónimo; godardíamo-nos num jogo de espelhos, onde o comboio a vapor de Magritte faz agulha para a via-férrea de Hernández. Preciso urgentemente de adquirir uma impressora, recomenda-me esta sensata quinta-feira de lazer a ouvir a Kreutzer Sonata; Concerto para Violino de Beethoven, conduzido por Isabelle Faust, recentemente apresentada por uma amiga. Se a tivesse, a intrometida e irritante impressora, estaria sentado na esplanada de lapiseira em punho a eliminar o que escrevi na Net, para o texto recuperar a sua forma natural no papel. Não se trata da quinta-feira ser um mau dia da semana para trabalhar, simplesmente coincide com o cansaço provocado pela alegria de o fazer ao domingo e à terça e à sexta-feira; não sei porquê, mas estes de boa memória. É certo que não tomo o pequeno-almoço na esplanada, de frente para a livraria com a naturalidade de Cossery; refeito do desengraçado post it estampado nos rostos que me rodeiam, sem praia à vista, atiro-me ao trabalho animado pela transgressão domingueira. Mas não me livro da síndroma contagiante da segunda-feira; levo com ela em cheio, proezas e desgraças, encenadas nos rostos fatigados que insistem em pretender sujar o meu.
23 de julho de 2010
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