12 de julho de 2011

Nem sempre a lápis (187)

«Um livro que não perdesse nunca de vista nem o lugar de onde eu estava a sair nem o lugar para onde, nem que só de mim para mim, onde quer que estiver, estarei sempre a voltar.» Ruy Duarte de Carvalho pertence à estirpe, à tribo de escritores em andamento, exploradores da palavra e do território onde a escrevem, juntamente com Bruce Chatwin, Paul Theroux, Tiziano Terzani, enumerados pela ordem com que viajámos e retomamos momentâneos passeios. Traduções, réplicas de um original a que não tenho acesso. E é precisamente isso que me surpreende e cativa ao ler o escritor português africano, suponho que consideraria o meu tratamento correcto, a capacidade de reflectir paisagens verbais, a desmedida da escrita como sobreposição e sedimentação de territórios orais. Os papa-léguas clássicos – «essa onda de literatura imperialista, que depois Conrad põe na ordem» – não me interessam, falam de realidades desactualizadas; Terzani é um subtil lapidador de fósseis literários. Eles os dois e Chatwin e Theroux, os meus exploradores fizeram o trabalho; não me surpreende ler uma situação acabada de traduzir numa sala sem pestanas, luminosa. Em Perder Teorias, Raymond Roussel «escreveu alguns dos seus textos numa roulotte preta com as persianas corridas; uma roulotte com que se dedicou a dar voltas pelo mundo, seguramente só pelo seu mundo.» Em Desmedida crónicas do Brasil, o escritor português africano conta que Roussel escreveu esses textos «sem de África jamais ter passado da cidade do Cairo e ainda assim sem nunca ter saído da roulotte que mandou fabricar para dar dessa maneira a volta ao mundo…»

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