30 de novembro de 2013

Nem sempre a lápis (458)

Memória descritiva
Laranja
A estrada para o Caramulo acendia-se de laranjas.
A berma ladeava-se de cestas traiçoeiras, que desafiavam a atenção dos condutores e atiçavam discussões familiares.
A que lhes era alheio o sabor e o preço.
Pelo caminho ficavam as confidências das meninas.
Seios à dimensão de uma laranja, revelados em aulas improvisadas pela curiosidade.
Os gomos adocicavam-nos o tacto, sem que os dedos se quebrassem na expectativa.
Miller fez-me correr pomares à procura das laranjas de Hieronymus.
Mas tudo quanto vi foram as cascas deixadas por Al-Mu’tamid, junto ao sabor uniformizado pela Europa.
Uma vez, o vento atirou-me uma azahar para dentro do chá, em Tânger.
Finalmente, a flor da laranjeira sossegava-me a cabeça no regaço das estradas.

2 comentários:

Maria Eu disse...

E tudo começa na flor imaculadamente branca...

fallorca disse...

:)